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Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00374/17.4BECTB
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:07/12/2018
Tribunal:TAF de Mirandela
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:PRÉ-CONTRATUAL; ASSINATURA ELETRÓNICA DE DOCUMENTOS;
Sumário:
1 – Constando n.º 3 da Cláusula 8ª do Programa do Concurso a obrigação de todos os documentos carregados na plataforma eletrónica deverem ser assinados eletronicamente mediante a utilização de certificados de assinatura eletrónica qualificada, não podem os candidatos deixar de cumprir o estabelecido concursalmente.
2 – Correspondentemente, os documentos juntos ao procedimento concursal deverão ser carregados na plataforma eletrónica, individualmente assinados, sem prejuízo da assinatura do correspondente ficheiro devidamente encriptado.
3 – Com efeito, a submissão da proposta efetiva-se com a assinatura eletrónica da proposta por utilizador autorizado e identificado.
Os documentos carregados nas plataformas eletrónicas deverão ser assinados eletronicamente mediante a utilização de certificados de assinatura eletrónica qualificada, sendo que no caso em que o certificado digital não possa relacionar diretamente o assinante com a sua função e poder de assinatura a entidade interessada deverá submeter à plataforma um documento eletrónico oficial indicando o poder de representação e assinatura do subscritor. *
*Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:GD, C… e T…, Lda
Recorrido 1:MTV, E… e C…, S.A
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Impugnação Urgente - Contencioso pré-contratual (arts. 100º e segs. CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida e julgar improcedente a acção
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I Relatório
A GD, C… e T…, Lda., Contrainteressada na presente Ação, intentada pela MTV, E… e C…, S.A., contra a CID, tendente à anulação do ato de exclusão da proposta que apresentou, bem como a anulação do ato de adjudicação da proposta apresentada pelas Contrainteressadas, inconformada com a Sentença proferida no TAF de Mirandela, que julgou a ação procedente, mais anulando o ato de exclusão da proposta da Autora, bem como do ato de adjudicação subsequente, condenando ainda a Entidade Demandada a retomar o procedimento na fase de análise das propostas, veio Recorrer da mesma, concluindo:
“Do Enquadramento do processado e do objeto do recurso
A. A Autora instaurou os presentes autos de ação de contencioso pré-contratual ao abrigo dos art.ºs 100.º e ss. do CPTA, em que pede a anulação do ato de exclusão da proposta que apresentou, bem como a anulação do ato de adjudicação da proposta apresentada pelas Contrainteressadas e pede ainda, cumulativamente, a condenação da Entidade Demandada a admitir a sua proposta e a proceder à sua graduação no concurso, invocando que inexiste fundamento legal para a exclusão da sua proposta, cuja assinatura digital cumpria o disposto na lei e nas peças concursais aplicáveis.
B. Após terem sido citados, a Demandada CMD e as Contrainteressadas, GD e EF, S.A., deduziram contestação, impugnando os factos e os pedidos formulados pela Demandante, por no seu entender não lhe assistir razão, e pugnando pela improcedência da presente ação.
C. Entretanto foi proferido douto despacho saneador no qual se fixou o seguinte objeto do litígio: Apurar a legalidade do ato de adjudicação que vem impugnado nos presentes autos bem como, em caso de procedência das ilegalidades imputadas ao ato, aferir a verificação dos pressupostos para a condenação da Entidade Demandada à admissão da proposta apresentada pela Autora.
D. Segundo a douta sentença cumpriria então apreciar a invalidade imputada pela Autora ao ato de exclusão da sua proposta, que consiste no vício de violação de lei acima identificado, bem como aferir da verificação dos pressupostos para a condenação à prática de ato de admissão,
E. Quando o que está em causa concretamente a assinatura qualificada de todos os documentos e ficheiros que integravam a proposta pela Autora e a sua exclusão por apenas ter sido assinada a sua submissão e não os documentos.
F. O presente recurso vem interposto da douta sentença que julgou a presente ação procedente, e que, consequentemente, deve ser revogada a Douta Sentença, devendo outrossim a ação ser julgada improcedente e não provada.
Da impugnação dos factos provados e nulidade
G. A Recorrente impugna os factos dados como provados 3 e 4 da douta sentença, porque os esclarecimentos apresentados pela plataforma eletrónica Saphety Level nos documentos que antecedem referem-se ao art.º 68.º ao carregamento e submissão da proposta, ou seja, ao contrário do firmado pela Autora, e segundo a alegação da Entidade Demandada, falta a assinatura digital eletrónica qualificada nos documentos da proposta da Autora.
H. Sendo certo que, no caso concreto é evidente que a assinatura não relaciona o assinante com a sua função e poder de assinatura, sendo que a Autora, e os documentos que antecedem não referem o contrário, não foi junto por aquela qualquer documento eletrónico oficial indicando e fazendo prova do poder de representação e assinatura do assinante.
I. Conforme refere a Saphety Level “Os documentos relativos à proposta em questão foram assinados mediante a aposição de assinatura qualificada do cartão de cidadão de DODS, diretamente na plataforma...”
J. De resto os documentos apresentados pela Autora que estejam em contradição ou sentido oposto na sua interpretação com o presente articulado, de resto não fazem prova do alegado pela Autora.
K. Tais factos (3 e 4) são meramente conclusivos e não correspondem às exigências procedimentais, regulamentares e legais, não tendo esses factos dados como provados sustento.
L. Assim, considerando a violação do art.º 94.º do CPTA quanto ao seu teor (dos factos provados e foram de transcrição criticada) constitui uma nulidade ao abrigo dos art.ºs 1.º, 94.º e 95.º do CPTA e dos art.ºs 607.º, 614.º, 615.º, n.º 1, al. b) e c), todos do CPC,
M. Devendo em qualquer circunstância tais factos ser dados como não provados (3 e 4 da douta sentença) por carecerem de sustento de facto e de Direito.
Do Direito aplicável e da devida revogação da douta sentença
Do valor da ação
N. A sentença recorrida que fixa o valor da ação enferma de erro de julgamento por errónea interpretação e aplicação dos artigos 34º, 33.º e 32º, nº 2 do CPTA.
O. Para tanto, entendeu o tribunal a quo que se aplicava, in casu, o disposto no nº 2 do artigo 32º do CPTA, afastando a possibilidade de subsumir este caso ao critério supletivo postulado no artigo 34º do mesmo diploma legal, entendimento foi crucial para sustentar a decisão de fixar à presente ação o valor de € 905.484,42€ quando a Autora havia indicado o valor de 30.000,01€ e o mesmo nem sequer tinha sido impugnado pelas demais partes.
P. Não se vislumbra uma razão válida para se afastar o critério supletivo previsto no artigo 34º do CPTA, no contencioso pré-contratual, isto é, nos atos relativos à formação de contratos, pois, o nº 2 do artigo 32º do CPTA, atenta sua redação, não se enquadra nos casos de contencioso pré-contratual.
Q. A sentença recorrida padece, nesta medida, de um erro de julgamento, por errónea interpretação do artigo 34º do CPTA e errónea interpretação e aplicação dos artigos 32º, nº 2, e 33.º, ambos do CPTA.
R. Acresce referir que, contrariamente ao considerado pelo tribunal a quo, para efeitos de aplicação das citadas disposições legais, a “utilidade económica” inerente ao pedido da Recorrida, não seria de atender ao preço total do contrato, outrossim sempre seria de retirar a parte desse valor que iria suportar a prestação do serviço, nomeadamente os custos dos materiais, dos equipamentos e da mão-de-obra.
S. Nesta medida, numa situação como a dos autos, em que está em causa a impugnação de um ato atinente à formação do contrato, in casu, de qualificação ou não de um candidato, por maioria de razão, a utilidade económica do pedido não há de poder reportar-se ao preço base do procedimento ou ao valor do contrato.
T. Nesse sentido o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 04- 11-2016 disponível em
http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/c6cfc93cb7d787d68025808e0058f034?OpenDocument&ExpandSection=1,2,3,4,5,6,7
U. Assim sendo, parece claro que o valor atribuído pela própria Recorrida na petição inicial, e não impugnado, de € 30.00,01, deverá ser o fixado para a presente ação de contencioso pré-contratual, com fundamento no disposto no artigo 34º do CPTA, devendo, como tal, ser revogada a sentença.
Da fundamentada exclusão da Autora pelo vício de violação dos pressupostos dos art.ºs 54.º e 68.º da Lei n.º 96/2015 de 17 de Agosto, 62.º do CCP e 7.º do CPA, quanto à omissão pela Recorrida da assinatura digital qualificada de todos os documentos:
V. Entendendo a douta sentença que da lei não decorre a obrigatoriedade de esta última assinatura ser uma assinatura eletrónica qualificada dos documentos, não havendo, segundo aquela, diferenças na submissão/receção da proposta.
W. À luz do que vem exposto procedeu a pretensão anulatória formulada pela Autora nos presentes autos contra o ato de exclusão, bem como, consequentemente, contra o ato de adjudicação das propostas das Contrainteressadas.
X. E nos termos do art. 95.º, n.º 5, do CPTA, condenou a Entidade Demandada a retomar o procedimento na fase de análise das propostas, respeitando as vinculações decorrentes da presente sentença e que constituem fundamento da procedência do pedido anulatório.
Porém, na verdade, a interpretação correta é diferente da douta sentença:
Y. Na verdade, Entidade Demandada no Relatório Final já explicou que o n.º 3 da Cláusula 8ª do Programa do Concurso prevê que: Todos os documentos carregados na plataforma eletrónica deverão ser assinados eletronicamente mediante a utilização de certificados de assinatura eletrónica qualificada.
Z. Sendo que o art.º 62.º do CCP prevê que: 1 - Os documentos que constituem a proposta são apresentados diretamente em plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante, através de meio de transmissão escrita e eletrónica de dados
4 - Os termos a que deve obedecer a apresentação e a receção das propostas nos termos do disposto nos n.ºs 1 a 3 são definidos por diploma próprio.
AA. Aqui surge então o art.º 54.º da Lei n.º 96/2015, de 17 de Agosto que prevê: 1 - Os documentos submetidos na plataforma eletrónica, pelas entidades adjudicantes e pelos operadores económicos, devem ser assinados com recurso a assinatura eletrónica qualificada, nos termos dos n.ºs 2 a 6. ... 7 - Nos casos em que o certificado digital não possa relacionar o assinante com a sua função e poder de assinatura, deve a entidade interessada submeter à plataforma eletrónica um documento eletrónico oficial indicando o poder de representação e a assinatura do assinante. – sublinhado e negrito nosso
BB. Quer os esclarecimentos apresentados pela plataforma eletrónica ShaphetyGov à Autora em sede de audiência prévia referem-se ao art.º 68.º do referido diploma quanto ao carregamento e submissão da proposta, ou seja, ao contrário do firmado pela Autora, e segundo a alegação da Entidade Demandada, falta a assinatura digital eletrónica qualificada nos documentos da proposta da Autora.
CC. Estamos certos pela prova documental junta pela Autora aos presentes autos que não é feita qualquer prova por aquela do cumprimento do n.º 3 da Cláusula 8ª do Programa de Concurso, o art.º 62.º, nºs 1 e 4 e o art.º 54.º, nºs 1 e 7 da Lei n.º 96/2015 de 17 de Agosto, quanto à aposição de assinatura digital eletrónica qualificada nos documentos da proposta omitida pela Autora.
DD. Acrescentamos que o art.º 57.º, nº 4 do CCP prescreve que a declaração referida na alínea a) do nº 1 deve ser assinada pelo concorrente ou por representante que tenha poderes para o obrigar.
EE. Sendo também relevante que a falta de assinatura pode também induzir na falta de poderes para obrigar e comprometer a concorrente no concurso, pois tais poderes são imprescindíveis e devem ser expressos de acordo com o disposto no artigo 260.º, nº 4 do Código das Sociedades Comerciais.
FF. Sendo certo que, nos casos em que a assinatura não relacione o assinante com a sua função e poder de assinatura, deve o interessado submeter à Plataforma um documento eletrónico oficial indicando o poder de representação e assinatura do assinante pois que, se o não fizer, resulta a exclusão da proposta ou dos documentos que se queriam submeter – cfr. art.º 54.º, n.º 7, da Lei n.º 96/2015 de 17 de Agosto.
GG. O regime normativo acabado de expor evidencia que, no âmbito de procedimento concursal desenvolvido sob a égide da Plataforma eletrónica, não só a proposta deve ser transmitida por meios eletrónicos como a sua assinatura deve ser feita eletronicamente, sendo que o momento da sua submissão se efetiva com a sua assinatura eletrónica por utilizador autorizado e identificado e que no caso do certificado digital não relacionar diretamente o assinante com a sua função e poder de assinatura é obrigatório que o candidato/concorrente submeta à plataforma um documento eletrónico oficial indicando o poder de representação e assinatura do assinante.
HH. E isto porque, sendo proposta um elemento fundamental do procedimento concursal - é nela que os concorrentes assumem de forma séria e firme não só a vontade de contratar mas também o modo como se dispõem a fazê-lo (art.º 56.º/1 do CCP) - a mesma só é válida se o seu conteúdo e formulação observarem as prescrições legais.
II. Estava, pois, vedado à entidade adjudicante convidar a Autora a assinar a sua proposta não só porque a irregularidade da sua proposta não tinha a ver com a clareza dos seus conteúdos ou dos documentos que as acompanhavam mas também porque tal falta determinava a sua inexistência e a consequente exclusão do concurso (cfr. art.ºs 70.º e 72.º à contrário).
JJ. Tendo em conta o disposto nos art.ºs 54.º, n.º 5 e 64.º, nºs 1 e 2, da Lei n.º 96/2015, de 17 de Agosto, a entidade adjudicante pode fazer exigências quanto a características dos ficheiros que contêm os documentos que constituem as propostas apresentadas pelos concorrentes nas plataformas eletrónicas, com a respetiva assinatura eletrónica, devendo, para o efeito, incluir no programa do procedimento as respetivas especificações, inclusive quanto ao formato dos documentos e ao universo das aplicações informáticas de base cujo uso é aceitável.
KK. Sendo a exigência de uma assinatura eletrónica individualizada constante do artigo 54.º da Lei n.º 96/2015, de 17 de Agosto é um requisito ad probationem quanto às consequências probatórias específicas da sua aposição a um documento eletrónico.
LL. De resto assim é o entendimento da jurisprudência:
Acórdão do Tribunal Administrativo Central Sul de 28-07-2017 disponível em
http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/a01e0577e32d59388025818a004c3b15?OpenDocument
Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 03-12-2015 disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/ab77346f35ea396a80257f22005a9c71?OpenDocument&ExpandSection=1
Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 25-11-2011 disponível
http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/6e55d16c2d4da4c68025795e00404472?OpenDocument
Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 08-03-2012 disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/de991656d5c84874802579c6003f89ab?OpenDocument&ExpandSection=1
MM. Assim, a única conclusão possível do Direito, e dúvidas não podem restar, é que a Autora deveria ser, como de resto foi, excluída por violação do n.º 3 da Cláusula 8ª do Programa de Concurso, bem como por força dos art.ºs 56.º, 57.º, 62.º, 146.º, n.º 2, al. d), e), l) e o), art.º 70.º, n.º 2, al. f) e 132.º, todos do CCP e art.º 54.º, nºs 1 e 7 da Lei n.º 96/2015, de 17 de Agosto.
NN. Pelo que, considerando o objeto do litígio que consta do Douto Despacho saneador e apurada a legalidade do ato de adjudicação que vem impugnado nos presentes autos e, consequentemente, a improcedência das ilegalidades imputadas ao ato pela Autora, que de resto deverá manter a proposta excluída, julgando a presente ação por não provada e improcedente.
Quanto à correta fundamentação do júri do procedimento.
OO. Por último, os referidos normativos referidos e o art.º 152.º do Código Procedimento Administrativo correspondem ao cumprimento do postulado no atual artigo 268º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa no qual se consagra o dever de fundamentação e correspondente direito subjetivo do administrado à fundamentação, na realização do interesse público, com presteza, eficácia e racionalidade.
PP. Quer do relatório preliminar, quer do relatório final que deu origem à decisão de adjudicação, extrai-se que o Júri do Procedimento respeitou o seu dever de fundamentação quod erat demonstradum e as outras Concorrentes Contrainteressadas tiveram o mesmo tratamento de igualdade, proporcionalidade e concorrência (cfr. art.º 1.º, n.º 4, do CCP e art.º 266.º da CRP).
QQ. Nestes termos o recurso deverá ser julgado procedente e a douta sentença revogada e substituída por outra em que resulte a improcedência da ação.
Nestes termos e nos melhores de Direito aplicável, que V.ª Exª. doutamente suprirá, tendo em conta a fundamentação de facto e Direito supra ser julgado procedente e provado o presente recurso e, consequentemente, ser revogada a Douta Sentença, devendo outrossim a ação ser julgada improcedente e não provada, com custas a cargo da Autora.”
*
Não foram apresentadas contra-alegações de Recurso.
*
Em 12 de junho de 2018 foi proferido Despacho de sustentação da decisão e admissão do Recurso apresentado.
*
O Ministério Público junto deste Tribunal, devidamente notificado, nada veio dizer, requerer ou Promover.
*
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas no Recurso, mormente verificando se se deveria manter a exclusão da proposta apresentada pela Autora, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.
III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade como provada:
Factos provados
Consideram-se provados os seguintes factos relevantes para a decisão da causa, de acordo com as várias soluções plausíveis de direito:
1. Em 24.01.2017, foi publicado no Diário da República o anúncio de procedimento n.º 531/2017, através do qual a Entidade Demandada deliberou aprovar a abertura de um procedimento de concurso público com vista à celebração de um contrato com o seguinte objeto
Elaboração do cadastro das infraestruturas existentes dos sistemas em baixa de Abastecimento de Água (AA) e de Saneamento de Águas Residuais (SAR) dos concelhos de Alijó, Armamar, Freixo de Espada à Cinta, Mesão Frio, Moimenta da Beira, Murça, Penedono, Peso da Régua, Sabrosa, Santa Marta de Penaguião, São João da Pesqueira, Sernancelhe, Tabuaço, Tarouca e Torre de Moncorvo.” (cfr. anúncio junto como ficheiro n.º 04 do p.a. e como doc. 1 da p.i.).
2. Do Programa de Procedimento aplicável ao procedimento em causa nos autos consta, entre outros, o seguinte:
(…)
Cláusula 7.ª | Proposta
1. O concorrente manifestará, na proposta, a sua vontade de contratar e indicará as condições em que se dispõe a fazê-lo.
2. Na proposta o concorrente deverá indicar o preço total, por lote a que concorre, conforme modelo Anexo II.
3. Todos os preços deverão ser expressos em euros, por extenso e em algarismos, e não indicarão o IVA, devendo o concorrente indicar a respetiva taxa legal aplicável deste imposto. Em caso de divergência prevalece o preço indicado por extenso.
. Os preços totais apresentados terão um máximo de 2 casas decimais.
5. A proposta deverá ser apresentada na plataforma eletrónica SaphetyGov, contendo assinatura eletrónica qualificada do concorrente ou seu representante. Sempre que seja assinada por procurador, juntar-se-á procuração que confira a este último poderes para o efeito, ou pública-forma da mesma, devidamente legalizada.
6. Quando, pela sua natureza, qualquer documento dos que constituem a proposta não possa ser apresentado nos termos do disposto nos números anteriores, a sua apresentação deverá ser efetuada de acordo com o disposto no n.º 5 do art.º 62º do CCP.
7. No caso de agrupamento de concorrentes, a proposta deverá ser assinada por todas as entidades que o compõem, ou pelos seus representantes, ou pelo representante comum, caso aquelas o tenham designado, devendo este, para tal, estar devidamente mandatado.
8. Todas as despesas inerentes à elaboração da proposta serão da responsabilidade do concorrente.
Cláusula 8.ª | Documentos que constituem a proposta
1. A proposta é constituída pelos seguintes documentos:
a. Documento Europeu Único de Contratação Pública (DEUCP), elaborado online (por carregamento do ficheiro “espd-request.xml”, e seguindo as instruções fornecidas no anexo I):
i. O DEUCP deve ser assinado pelo concorrente ou por representante que tenha poderes para obrigar;
ii. No caso da apresentação por um agrupamento deve ser preenchido um DEUCP por cada membro que o integra;
iii. Deve ser enviado em ficheiro com a designação “Anexo1_[designação_concorrente].pdf”;
b. Modelo da proposta, utilizando o formulário do Anexo II a este programa do concurso, que deverá cumprir o disposto no artigo 60.º do CCP e ser enviada num ficheiro com a designação “Anexo2_[designação_concorrente].pdf”;
c. Memória Descritiva e Justificativa do modo de elaboração do serviço, que deverá ser enviada num ficheiro com a designação “MDJ_[designação_concorrente].pdf”, incluindo: (a) programa de trabalhos; (b) metodologia de desenvolvimento dos trabalhos; (c) cronograma de execução das ações; (d) condições de pagamento e (e) proposta de codificação de objetos e domínios (se diferente da sugerida no Caderno de Encargos);
d. Documento que contenha os termos ou condições, relativos a aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule, que são os seguintes:
i. Prazo de prestação do serviço, de acordo com as Especificações Técnicas - Parte ll do Caderno de Encargos;
ii. Condições de pagamento, que será no mínimo de 30 (trinta) dias, após receção e conferência da fatura.
e. Certidão do registo comercial (certidão permanente), com todas as inscrições em vigor, para identificação dos titulares dos órgãos sociais de administração, direção ou gerência que se encontrem em efetividade de funções, documento equivalente, ou código de acesso online à certidão permanente;
f. Documentos que contenham os esclarecimentos justificativos da apresentação de um preço anormalmente baixo, quando esse preço resulte, direta ou indiretamente, das peças do procedimento.
. No caso de agrupamento de concorrentes, a proposta poderá ser acompanhada de instrumentos de mandato, emitido por cada uma das entidades que o compõe, designando um representante comum para praticar todos os atos no âmbito do concurso.
3. Todos os documentos carregados na plataforma eletrónica deverão ser assinados eletronicamente mediante a utilização de certificados de assinatura eletrónica qualificada.
4. Nos casos em que o certificado digital não possa relacionar diretamente o assinante com a sua função e poder de assinatura, deverá a entidade interessada submeter à plataforma um documento eletrónico oficial indicando o poder de representação e assinatura do assinante.
5. Todos os documentos deverão ser redigidos em língua portuguesa, ou, não o sendo, deverão ser acompanhados de tradução devidamente legalizada e em relação à qual o concorrente declare aceitar a prevalência, para todos os efeitos, sobre os respetivos originais.
6. Qualquer classificação de documentos que constituem a proposta deverá ser previamente requerida pelos interessados, nos termos do artigo 66.º do CCP.
(cfr. programa de procedimento junto como ficheiro n.º 01 do p.a. e como doc. 2 da p.i.)
3. Em 10.03.2017, a Autora apresentou a sua proposta, composta pelos ficheiros com a seguinte designação:
- Anexo2_MTV.pdf
- Anexo2_MTVASSINADO.pdf
- Anexo 1_MTV.pdf
- Anexo I_CCP.pdf
- Documento Prazo e Cond.Pagamento.pdf
- MDJ_MTV.pdf
- Certidão Permanente.pdf
- CF & PP.pdf
- 06.17 Plano de Trabalhos.pdf
- Plano de EQUIP.pdf
- Plano de MDO.pdf
- Proposta.pdf
- Procuração.pdf
- Nota Justif Preço Anormalmente Baixo.pdf
(cfr. recibo comprovativo junto como do. 1 da p.i. e documentos junto a fls. 309 e ss dos autos).
4. Os ficheiros eletrónicos referidos em 3 foram encriptados e assinados, aquando da sua submissão na plataforma eletrónica, com recurso a uma assinatura eletrónica qualificada (cfr. proposta junta como ficheiro n.º 15 do p.a., recibo comprovativo e e-mail junto ao documento constante do ficheiro n.º 36 do p.a., relatório preliminar junto como ficheiro n.º 35 do p.a. e documentos junto a fls. 309 e ss dos autos).
5. Em 19.06.2017, foi emitido pelo júri do procedimento um relatório preliminar de análise das propostas, de que consta, entre outros, o seguinte:
(…)
• Concorrente (7) MTV, S.A.: O concorrente não assinou digitalmente os documentos, não cumprindo o estipulado nª 3 da cláusula 8ª do Programa de Concurso nem o n.º 1 do art.º 27º da Portaria n.º 701-G/2008, de 29 julho, pelo que, de acordo com a al. l) do n.º 2 do art.º 146.º do CCP, a proposta do concorrente será excluída. (…)”
(cfr. relatório preliminar junto como ficheiro n.º 35 do p.a. e como doc. 4 da p.i.).
6. Em 29.06.2017, a Autora apresentou a sua pronúncia quanto ao relatório preliminar referido em 5, com o seguinte conteúdo:
MTV, E… e C… S.A., concorrente melhor identificada no âmbito do concurso público para Elaboração de cadastro de infraestruturas de AA e SAR de concelhos da CMD, tendo sido notificada do relatório preliminar em que é proposta a sua exclusão em virtude da não assinatura dos documentos que compõem a proposta apresentada, vem junto de V. Exa., EXERCER O DIREITO DE AUDIÊNCIA PRÉVIA, o que faz nos seguintes termos:
1. A concorrente não pode concordar com os fundamentos constantes do relatório preliminar e que conduzem à sua exclusão do concurso.
2. De facto, a Concorrente submeteu todos os documentos que instruem a sua proposta através da plataforma eletrónica de contratação pública SaphetyGov devidamente assinados digitalmente, através de cartão do cidadão, e com a assinatura qualificada, nos termos da Lei.
3. Como tal, após o envio da proposta foi remetido à Concorrente o respetivo comprovativo de submissão onde consta que todos os documentos foram submetidos assinados e com a assinatura qualificada (cfr. documento que junta).
4. A concorrente solicitou, igualmente, à Plataforma SaphetyGov esclarecimento relativos a tal matéria, tendo-lhe sido comunicado via email que: “a assinatura por vós utilizada, é uma assinatura digital qualificada, tendo sido utilizado o cartão do cidadão”(cfr. doc. que se junta).
5. Ou seja, e de facto, todos os documentos que instruíram a proposta foram devidamente assinados digitalmente, e com a assinatura qualificada, pelo que não existem motivos para a exclusão da proposta nos termos constantes do relatório preliminar.
Nestes termos, deve ser admitida a proposta apresentada pela Concorrente “MTV, E... e C... S.A.”, revogando-se a decisão de exclusão.
(cfr. pronúncia junta como ficheiro n.º 36 do p.a.).
7. Em 27.07.2017, foi disponibilizado aos concorrentes o relatório final de análise das propostas, com o seguinte teor parcial:
(…)
» Análise das pronúncias
O Júri procedeu à análise das pronúncias dos concorrentes no que diz respeito ao teor e propostas contidas no Relatório Preliminar. Sem prejuízo de constarem nos Anexos I e II os textos integrais de tais pronúncias, vão adiante resumidos os seus pontos essenciais a fim de melhor ilustrar o acolhimento ou não acolhimento que mereceram.
Pronúncia 1 – Concorrente (7) MTV - E... e C... S.A.
De acordo com os termos e fundamentos contidos no Relatório Preliminar, aqui dados por reproduzidos, foram excluídas as propostas do concorrente a todos os lotes.
O concorrente contesta a exclusão das suas propostas, ao abrigo do direito de audiência prévia, com os fundamentos constantes do Anexo I ao presente Relatório Final, aqui dados por reproduzidos, e do qual fazem parte integrante, e que consistem, sucintamente, em:
“[…] a Concorrente submeteu todos os documentos que instruem a sua proposta através da plataforma eletrónica de contratação pública SaphetyGov devidamente assinados digitalmente, através de cartão do cidadão, e com a assinatura qualificada, nos termos da Lei.
3. Como tal, após o envio da proposta foi remetido à Concorrente o respetivo comprovativo de submissão onde consta que todos os documentos foram submetidos assinados e com a assinatura qualificada […]”
Apesar do concorrente alegar que os documentos submetidos foram assinados digitalmente com o Cartão do Cidadão, os documentos retirados da plataforma eletrónica não contêm, neles próprios, qualquer assinatura eletrónica.
Ora, o CCP consagrou expressamente no artigo 62.º o modo de apresentação das propostas, o n.º 1 estabelece que "os documentos que constituem a proposta são apresentados diretamente em plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante, […]” e, o n.º 4, indica que "os termos a que deve obedecer a apresentação e a receção das propostas […] são definidos por diploma próprio". O diploma que regula a referida apresentação das propostas é a Lei n.º 96/2015, de 17 de Agosto, dispondo o artigo 54º, n.º 1, que "os documentos submetidos na plataforma eletrónica, pelas entidades adjudicantes e pelos operadores económicos, devem ser assinados com recurso a assinatura eletrónica qualificada […]” e o artigo 68º, n.º 3, que “a plataforma eletrónica deve disponibilizar ao interessado as aplicações informáticas que permitam automaticamente, no ato de carregamento, encriptar e apor uma assinatura eletrónica nos ficheiros de uma proposta, localmente, no seu próprio computador”. Decorre, pois destas disposições legais a necessidade de todos os documentos serem assinados eletronicamente, pelo que tendo utilizado o legislador o termo "documento" quando se refere à assinatura pela entidade adjudicante e de "ficheiro" quando se refere à plataforma eletrónica, tem como consequência a necessidade de todos os documentos serem assinados independentemente da assinatura aposta pela plataforma eletrónica, condição reforçada no n.º 3 da cláusula 8ª do Programa de Concurso. Este entendimento é fundamentado na segurança jurídica, quer ao nível da autenticidade e fidedignidade da documentação apresentada por um concorrente, quer ao nível da segurança e inviolabilidade dos documentos apresentados.
Assim, os esclarecimentos apresentados pela plataforma eletrónica ShaphetyGov ao concorrente referem-se à assinatura dos ficheiros da proposta aquando da inserção na plataforma eletrónica (para cumprimento do disposto no art.º 68º da Lei acima referida) faltando, no entanto, a assinatura digital eletrónica qualificada no próprio documento, inserida pelo próprio concorrente (para cumprimento do disposto no art.º 54º da já referida Lei), não procedendo, pois a argumentação apresentada pelo Concorrente (7) MTV - E... e C... S.A..
(…)
» Conclusão
Tendo em conta o que acima se decidiu, nos termos e com os fundamentos que antecedem, o júri:
A. Mantém a proposta, contida no Relatório Preliminar, de exclusão, nos termos do n.º 2 do artigo 146.º do CCP, para os lotes aí referidos, das propostas apresentadas pelos concorrentes: (2) GF, Lda., (7) MTV, S.A.; (8) TNF, S.A.; (9) VM, S.A. / EGD, Lda.; (10) GG, Lda.; (12) ES, Lda.; (13) LA, S.A.; (15) PRN, S.A. e (24) GMT, S.A. / SLG, Lda. / AT, Lda. / TPFPC, S.A.;
B. Mantém a proposta contida no Relatório Preliminar de, aplicados os critérios de adjudicação definidos no “Modelo de Avaliação das Propostas” constante do Anexo III do Programa de Concurso, ordenação das propostas relativas a cada um dos lotes, com base nos valores obtidos em resultado da aplicação das respetivas fórmulas de avaliação.
Adjudicação e Formalidades Complementares
» Proposta de adjudicação
Face ao que foi referido anteriormente e tendo em conta a ordenação das propostas, o júri propõe a adjudicação da “Elaboração de cadastro de infraestruturas de AA e SAR de concelhos da CMD” aos seguintes concorrentes, por lote:
Lote 1: Concorrente 18 - EF, S.A., pela quantia de 368 686,60 €, a que acresce o IVA, no montante de 84 797,92 €, totalizando o valor de 453 484,52 €;
Lote 2: Concorrente 18 - EF, S.A., pela quantia de 350 754,10 €, a que acresce o IVA, no montante de 80 673,44 €, totalizando o valor de 431 427,54 €;
Lote 3: Concorrente 5 - GD, C... e T..., Lda., pela quantia de 312 698,00 €, a que acresce o IVA, no montante de 71 920,54 €, totalizando o valor de 384 618,54 €;
Lote 4: Concorrente 5 - GD, C... e T..., Lda., pela quantia de 359 837,50 €, a que acresce o IVA, no montante de 82 762,63 €, totalizando o valor de 442 600,13 €. (…)”
(cfr. relatório final junto como ficheiro n.º 38 do p.a. e doc. 5 da p.i.).
8. Em 26.07.2017, por deliberação do Conselho Intermunicipal da Entidade Demandada, foi adjudicada a prestação de serviços objeto do procedimento referido em 1 às Contrainteressadas, nos termos e com os fundamentos constantes do relatório final referido no ponto anterior (cfr. notificação da adjudicação junta como ficheiro n.º 39 do p.a.).
*
IV – Do Direito
DO VALOR DA AÇÃO
Entendeu-se na decisão recorrida que o valor indicado pela Autora, enquanto valor de causa indeterminado, correspondente a 30.000,01€ deveria ser corrigido para 905.484,52€, em função do benefício económico decorrente do processo, por equivaler ao valor do contrato a celebrar no procedimento concursal em causa.
Em função do Recorrido, sem necessidade de particulares desenvolvimentos, por estarem em causa questões de natureza pré-contratual, face às quais não é possível estabelecer desde já um valor exato relativo ao potencial benefício económico, valerá a regra subsidiária, consignada no artigo 34º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, fixando-se o valor da Ação correspondente àquele que foi originariamente fixado, em 30.000,01€.
Diferente seria se estivesse em causa a impugnação da decisão de adjudicação, no âmbito da qual seria já mensurável a utilidade económica da Ação.
*
Por forma a verificar os vícios suscitados, no que aqui releva, veja-se aquilo que se discorreu em matéria de direito em 1ª instância:
“A Autora invoca a invalidade do ato da Entidade Demandada que determinou a exclusão da sua proposta do procedimento em causa nos autos, imputando-lhe um vício de violação de lei, por violação dos arts. 54.º e 68.º da Lei n.º 96/2015, de 17 de agosto, do art. 62.º do Código dos Contratos Públicos e do art. 7.º do Código de Procedimento Administrativo.
Para tanto, sustenta que procedeu à assinatura qualificada de todos os documentos e ficheiros que integram a proposta, utilizando como forma de certificação o cartão de cidadão do seu representante.
Em sentido contrário, a Entidade Demandada alega que os documentos apresentados pela Autora não continham uma assinatura eletrónica individualizada, conforme vem imposto pelo art. 54.º, n.º 1, da Lei n.º 96/2015, de 17 de agosto. Não está em causa, segundo alega, a assinatura dos ficheiros aquando da inserção dos ficheiros da proposta, para efeitos do art. 68.º deste mesmo diploma.
Vejamos então se procede o vício imputado pela Autora ao ato de exclusão da sua proposta, principiando por uma resenha das regras jurídicas aplicáveis.
O art. 62.º do CCP prevê o seguinte, nos n.ºs 1 e 3:
“1 - Os documentos que constituem a proposta são apresentados diretamente em plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante, através de meio de transmissão escrita e eletrónica de dados, sem prejuízo do disposto na alínea g) do n.º 1 do artigo 115.º,
(…)
4 - Os termos a que deve obedecer a apresentação e a receção das propostas nos termos do disposto nos n.ºs 1 a 3 são definidos por diploma próprio.”
O diploma a que se refere este n.º 4 do art. 62.º do CCP é, atualmente, a Lei n.º 96/2015, de 17 de agosto, que regula a disponibilização e a utilização das plataformas eletrónicas de contratação pública.
A respeito das assinaturas eletrónicas, o art. 54.º desta Lei n.º 96/2015 prescreve o seguinte, nos primeiros números:
“1 - Os documentos submetidos na plataforma eletrónica, pelas entidades adjudicantes e pelos operadores económicos, devem ser assinados com recurso a assinatura eletrónica qualificada, nos termos dos n.ºs 2 a 6.
2 - Os documentos elaborados ou preenchidos pelas entidades adjudicantes ou pelos operadores económicos devem ser assinados com recurso a certificados qualificados de assinatura eletrónica próprios ou dos seus representantes legais.”
Por seu turno, o art. 68.º prescreve o seguinte, nos respetivos n.ºs 1 e 3:
“1 - As plataformas eletrónicas devem permitir o carregamento progressivo, pelo interessado, da proposta ou propostas, até à data e hora prevista para a submissão das mesmas.
(…)
3 - A plataforma eletrónica deve disponibilizar ao interessado as aplicações informáticas que permitam automaticamente, no ato de carregamento, encriptar e apor uma assinatura eletrónica nos ficheiros de uma proposta, localmente, no seu próprio computador.”
Em consonância com tal disposição legal, o programa de procedimento do concurso em causa nos autos exigia, no art. 8.º, n.º 3, o seguinte:
“Todos os documentos carregados na plataforma eletrónica deverão ser assinados eletronicamente mediante a utilização de certificados de assinatura eletrónica qualificada.” (cfr. ponto 2 do probatório).
A tese defendida pela Entidade Demandada no ato impugnado e bem assim nos presentes autos é a de que os documentos devem ser assinados independentemente da assinatura aposta nos ficheiros pela plataforma eletrónica, através de assinatura eletrónica qualificada.
Ora, desde já se diga que não procede uma tal interpretação.
É certo que o art. 68.º recorre à palavra ficheiros, ao passo que o art. 54.º se refere a documentos, ambos a respeito da respetiva assinatura.
Contudo, entendemos que o uso das palavras é indiferenciado e não revela um qualquer propósito do legislador em exigir a duplicação de assinaturas.
É que o art. 54.º, com a epígrafe “Assinaturas eletrónicas”, debruça-se sobre os requisitos da assinatura dos documentos da proposta, numa perspetiva formal da mesma.
Já o art. 68.º vem regular o “carregamento das propostas”, estabelecendo as condições técnicas que as plataformas devem criar para o carregamento das propostas. É nesse prisma que o legislador explicita que a possibilidade de apor a assinatura aos ficheiros deve ser automaticamente disponibilizada no ato de carregamento da proposta.
Sendo o ficheiro o elemento eletrónico e o documento o respetivo conteúdo, quando cada ficheiro diga respeito a um único documento exigido pelo procedimento (cfr. art. 66.º, n.º 1, al. a), da Lei n.º 96/2015), está em causa uma diferença puramente conceptual de uma mesma coisa, vista na perspetiva do elemento físico e do respetivo conteúdo, a que corresponde uma única assinatura.
Neste sentido, vejam-se as seguintes palavras dos autores Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira: “Assim, os ficheiros são como que os fascículos, as “caixas” ou dossiers informáticos, digamos assim, onde – de acordo com as especificações do art. 15.º/ 2 da Portaria, nomeadamente das respeitantes ao conteúdo de cada um deles – se inserem os documentos das candidaturas, propostas e soluções.” (in ESTEVES DE OLIVEIRA, Mário, e ESTEVES DE OLIVEIRA, Rodrigo, Concursos e Outros Procedimentos de Contratação Pública, Coimbra: Almedina, 2011, p. 682).
E veja-se ainda o seguinte Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, do qual resulta o reconhecimento de uma equivalência entre ficheiro e documento sempre que cada documento seja agrupado num só ficheiro, sem prejuízo de se tratar aí de diferente questão:
“Com efeito, a lei atual (nº 1 e 5 do cit. artigo 54º), tal como a anterior, exige a assinatura individual de cada documento (que não de cada página), documento autónomo normalmente correspondente a um ficheiro informático.
Mas, como se sabe, um ficheiro informático, zip ou mesmo pdf, pode conter vários documentos diferentes ou autónomos, como se passa no caso presente.
Sublinhemos que, também o formato pdf, permite agregar e desagregar páginas e documentos ou ficheiros/arquivos diferentes (vd., por ex., o programa Adobe Acrobat XI: em “ferramentas”, “combinar arquivos em pdf”).
Pelo que, tendo a C-I R........ apresentado vários documentos agregados num só ficheiro pdf, tinha o dever legal de previamente assinar digitalmente cada um dos documentos autónomos.
Não o tendo feito, a proposta tinha de ser excluída, ao abrigo dos artigos 62º/4 e 146º/2-l) do CCP.” (cfr. Ac. do TCAS de 15.02.2019, proc. n.º 322/16.9BEFUN, in www.dgsi.pt).
Acresce que, ainda que a assinatura não resulte visível dos documentos, a verdade é que tal não vem exigido nas normas legais invocadas pela Entidade Demandada, prescrevendo-se apenas a necessidade de se proceder à assinatura dos documentos (cfr. arts. 54.º e 68.º da Lei n.º 96/2015).
Assim, há que concluir que, na situação dos autos, em todos os ficheiros foi efetivamente aposta uma assinatura digital qualificada, conforme prescrito pelo programa de procedimento e pela Lei n.º 96/2015 (cfr. pontos 3 e 4 do probatório).
A este respeito, considerando a argumentação aventada pela Entidade Demandada e pelas Contrainteressadas, é ainda de referir que a interpretação acima expendida dos arts. 54.º e 68.º da Lei n.º 96/2015 não obstam à distinção entre a assinatura da proposta para efeitos da submissão dos respetivos documentos e a assinatura de alguns dos documentos que compõem a proposta, em termos de vinculação da mesma, como é o caso da declaração referida no art. 57.º, n.º 4, do CCP.
Sucede que tal distinção – que remonta ao CCP e já não à Lei n.º 96/2015 - não tem os efeitos que lhe pretendem atribuir a Entidade Demandada e as Contrainteressadas.
É que - não se desconhecendo a existência de jurisprudência em contrário e com o maior respeito por tal posição -, entendemos que da lei não decorre a obrigatoriedade de esta última assinatura ser uma assinatura eletrónica qualificada.
Na verdade, as normas previstas nos arts. 54.º e ss da Lei n.º 96/2015, incluindo o art. 68.º, dizem respeito à assinatura que ocorre aquando da submissão da proposta, o que corresponde a uma condição da apresentação de todos os documentos da proposta (cfr. art. 62.º, n.º 4, do CCP) e não se confunde com a assinatura do concorrente ou do representante com poderes de vinculação de determinados documentos (cfr. art. 57.º, n.º 4, do CCP).
Ora, a diferenciação entre ambas estas assinaturas resulta, desde logo, da diferença entre a formulação do art. 54.º, n.º 1, da Lei n.º 96/2015, de 17 de agosto, que se refere à assinatura de todos os documentos aquando da submissão na plataforma eletrónica, e a formulação do art. 57.º, n.º 4, que estabelecia a obrigação de assinatura pelo concorrente ou representante com poderes de vinculação quanto a determinados elementos apenas (na versão que aqui releva).
É ainda de salientar que a Lei n.º 96/2015 surge para regular a disponibilização e a utilização das plataformas eletrónicas de contratação pública, estabelecendo os termos a que deve obedecer a apresentação e a receção das propostas em tal plataforma (cfr. art. 62.º, n.º 4, do Código dos Contratos Públicos).
Acresce que, estando em causa normas procedimentais formais, à letra da lei deve ser dado um peso significativo, enquanto elemento interpretativo da norma legal, sob pena de se estarem a criar exigências formais que não resultam claramente da lei.
(...)
Vejam-se, no sentido aqui sustentado, as seguintes doutas palavras do Tribunal Central Administrativo Sul, na senda de outra jurisprudência relevante nesta matéria:
“(…) há que distinguir a assinatura dos documentos que compõem a proposta (designadamente da declaração mencionada na al. a) do n.º 1 do art. 57º, do CCP, a qual pode ser manuscrita) da assinatura que ocorre aquando da submissão da proposta (a qual tem de ser uma assinatura eletrónica qualificada – cfr. art. 62º n.º 4, do CCP, art. 11º n.ºs 1 e 2, do DL 143-A/2008, de 25/7 (…), e art. 27º n.º 1, da Portaria 701-G/2008, de 29/7 (…)
(…)
Com efeito, e conforme se escreveu no Ac. do TCA Norte de 16.9.2011, proc. n.º 102/11.8BEPRT:
“Todas as recorrentes assinaram, ainda que de forma manuscrita digitalizada, as suas propostas, tendo aposto as suas assinaturas.
Contudo, a submissão (i.e., a entrega, o carregamento ou o envio) da proposta através da plataforma eletrónica apenas poder ser efetuada por um concorrente que tenha adstrita uma assinatura eletrónica mediante certificado de assinatura eletrónica certificada (cfr. artigos 19.º e 27.º da Portaria n.º 701-G/2008, de 29 de Julho) Bem como no Ac. do STA de 9.4.2014, proc. n.º 40/2014:
E é agora óbvio o lapso em que a autora incorreu no concurso dos autos. Ela confundiu a assinatura da declaração prevista no art. 57º, n.º 1, al. a), do CCP, indispensável à enunciação da vontade de contratar, com a assinatura digital dos documentos por terceiro, necessária para carregá-los na plataforma eletrónica.
Com efeito, a exigência dessa assinatura digital, porque primariamente ordenada à genuinidade do nexo entre os documentos carregados e a «entidade interessada» nesse carregamento, abrange-os a todos (cf. o art. 27º, n.º 1, da Portaria n.º 701-G/2008 – mesmo àqueles que, não contendo uma qualquer declaração do apresentante, que ele devesse assumir, não precisassem de assinatura, nos termos gerais. E, assim como a assinatura digital se tem de apor relativamente a documentos não assináveis, também convirá que a assinatura autógrafa se aponha nos documentos carregados por terceiro que a reclamem – sem embargo destes também necessitarem da assinatura digital para poderem ser carregados na plataforma eletrónica. Deste modo, a presença da assinatura digital do procurador da autora não supre a falta de assinatura nalgum documento que devesse ser assinado pelos gerentes dela – o que se deve ao pormenor dessas assinaturas, autógrafa e digital, cumprirem fins diversos.)
(…)
E conforme esclarece Vera Eiró, Quem não sabe assinar não pode participar? Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (1ª Secção) de 9.4.2014, P. 40/14, in Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 108, Nov.- Dez. 2014, pág. 40:
“3. Assinatura dos documentos que integram a proposta não é o mesmo que assinar digitalmente, para efeitos de submissão das propostas em plataforma eletrónica
Uma das questões que se afigura mais relevante na decisão sob anotação prende-se com a distinção feita pelo Tribunal entre a submissão de uma proposta através de plataforma eletrónica e a assinatura da proposta propriamente dita. É assente nesta distinção que o Tribunal conclui que os poderes para submeter eletronicamente uma proposta não se confundem com os poderes para assinar a proposta propriamente dita.
Parece-nos igualmente relevante a circunstância de o Tribunal permitir – e considerar que teria sido esse o caminho adequado – a assinatura autógrafa (manuscrita) da proposta pelos gerentes da sociedade devendo depois os mesmos documentos ser digitalmente assinados por pessoa com poderes para submeter eletronicamente a proposta na plataforma eletrónica.
Este enquadramento parece-nos adequado e afasta a linha decisória que o TCA Norte havia seguido em acórdão de 25/11/2011, já citado. Com efeito, o que o STA vem tornar claro é que as assinaturas das declarações referidas no CCP não têm, todas, de ser interpretadas por referência à assinatura eletrónica, tal como a mesma se mostra disciplinada no DL n.º 143-A/2008 e pela Portaria n.º 701-G/2008 (16 Veja-se, a este propósito, o Ac. do TCA Sul de 3/11/2011, P. 7960/11, que também parece seguir esta linha de entendimento).
(…)” (Ac. do TCAS de 03.11.2016, proc. n.º 13703/16, in www.dgsi.pt).
Finalmente, cumpre salientar que o programa de procedimento dos autos, a este respeito, reproduz muito aproximadamente o art. 54.º, n.ºs 1 e 7 da Lei n.º 96/2015, pelo que não pode interpretar-se o mesmo como uma exigência adicional das peças de concurso face à lei aplicável (cfr. cláusula 8.ª, n.º 3 e 4 do programa de procedimento, conforme ponto 2 do probatório).
À luz do que vem exposto, deve, pois, proceder totalmente a pretensão anulatória formulada pela Autora nos presentes autos contra o ato de exclusão, bem como, consequentemente, contra o ato de adjudicação das propostas das Contrainteressadas.
As Contrainteressadas sustentam ainda que a proposta da Autora não respeita o disposto no art. 54.º, n.º 7, da Lei n.º 96/2015, segundo o qual, nos casos em que a assinatura qualificada não possa relacionar o assinante com a sua função e poder de assinatura, deve a entidade interessada submeter à plataforma eletrónica um documento oficial indicando o poder de representação e assinatura do assinante.
Contudo, há que realçar que uma tal questão não releva para a presente decisão, na medida em que não é fundamento do ato impugnado, nem, por esse mesmo motivo, objeto da presente ação.
Na verdade, ao tribunal não compete proceder à análise das propostas em substituição da Entidade Demandada, sob pena de violação do princípio da separação e interdependência dos poderes previsto no art. 3.º, n.º 1, do CPTA.
Cumulativamente com o pedido anulatório, a Autora pede ainda a condenação da Entidade Demandada à admissão da sua proposta.
Sucede que a análise das propostas apresentadas no procedimento dos autos implica uma valoração própria da função administrativa, de caráter eminentemente técnico.
Recorrendo às palavras dos autores supra citados, “(…) quanto à determinação e verificação de alguns dos pressupostos de aplicação da medida de exclusão foi-lhes deixada [- aos órgãos instrutores -] alguma margem de apreciação.
(…)
Quando se fala aqui em momentos “discricionários” o que se pretende pois é salientar que, em matéria de eleição ou definição dos pressupostos ou causas de exclusão, há casos de valorações ou juízos mais propensos à função administrativa, como se passa com a delimitação e aplicação de conceitos muito técnicos ou de conceitos imprecisos ou indeterminados.” (in ESTEVES DE OLIVEIRA, Mário, e ESTEVES DE OLIVEIRA, Concursos …, pp. 955 e 956).
Assim sendo, não cabe ao tribunal determinar a condenação da Entidade Demandada à prática de ato que decida a admissão da proposta.
Contudo, nos termos do art. 95.º, n.º 5, do CPTA, condena-se a Entidade Demandada a retomar o procedimento na fase de análise das propostas, respeitando as vinculações decorrentes da presente sentença e que constituem fundamento da procedência do pedido anulatório.”
Analisemos então o que aqui está em causa.
Foi originariamente intentada a presente ação tendente à anulação do ato de exclusão da proposta da Autora, bem como a anulação do ato de adjudicação da proposta apresentada pela Contrainteressada, mais se peticionando a condenação da Entidade Demandada a admitir a sua proposta e a proceder à sua graduação.
Em sede de Despacho Saneador, foi fixado o seguinte objeto:
“Apurar a legalidade do ato de adjudicação que vem impugnado nos presentes autos bem como, em caso de procedência das ilegalidades imputadas ao ato, aferir a verificação dos pressupostos para a condenação da Entidade Demandada à admissão da proposta apresentada pela Autora.”
Consequentemente, o tribunal a quo decidiu, a final, anular o ato de exclusão da proposta da Autora, bem como do ato de adjudicação subsequente, mais condenando a Entidade Demandada a retomar o procedimento na fase de análise das propostas, com observância das vinculações decorrentes da procedência da pretensão anulatória.
Vejamos:
Dos fundamentos do recurso:
A Recorrente impugna desde logo os factos dados como provados 3 e 4 da sentença, por entender que os esclarecimentos apresentados pela plataforma eletrónica Shaphety Level relativamente aos descritos documentos se referem ao art.º 68.º face ao carregamento e submissão da proposta, não se reportando à assinatura digital eletrónica qualificada nos documentos da proposta da Autora.
Em qualquer caso, os factos 3 e 4 da matéria dada como provada são meramente circunstanciais e descritivos, não influindo na decisão proferida ou a proferir.
Na realidade, o facto 3 enuncia os ficheiros apresentados na plataforma, o que é factual, sendo que o facto 4 se limita a referir que os correspondentes ficheiros “foram encriptados e assinados, aquando da sua submissão na plataforma eletrónica, com recurso a uma assinatura eletrónica qualificada”.
Efetivamente, é certo que os ficheiros foram apresentados na plataforma e que foram assinados. Em qualquer caso, o que determinou a exclusão da proposta não foi o facto dos ficheiros não estarem assinados, mas sim o factos dos documentos neles inseridos não o estarem, o que determina que, como se disse, a redação dada aos factos 3 e 4 não colide com qualquer decisão que seja adotada face à assinatura dos documentos.
Admite-se que os ficheiros eletrónicos referidos em 3 tenham sido encriptados e assinados, aquando da sua submissão na plataforma eletrónica, com recurso a uma assinatura eletrónica qualificada, mas não é essa a questão. O que ficou por demonstrar foi que os correspondentes documentos tenham sido assinados.
Como se sumariou no acórdão deste TCAN nº 00809/16.3BEAVR, de 11.05.2017, “A apresentação da proposta por concorrente [e documentos anexos] no âmbito de procedimento concursal desenvolvido sob a égide de plataforma eletrónica carece de ser produzida por meio de transmissão escrita e eletrónica de dados através do progressivo carregamento dos ficheiros e dos formulários respetivos, devidamente encriptados, sendo que o momento da submissão da proposta se efetiva com a assinatura eletrónica da proposta por utilizador autorizado e identificado.
Tais documentos carregados nas plataformas eletrónicas deverão ser assinados eletronicamente mediante a utilização de certificados de assinatura eletrónica qualificada, sendo que no caso em que o certificado digital não possa relacionar diretamente o assinante com a sua função e poder de assinatura a entidade interessada deverá submeter à plataforma um documento eletrónico oficial indicando o poder de representação e assinatura do subscritor.”
Aqui chegados, é incontornável o facto do n.º 3 da Cláusula 8ª do Programa do Concurso obrigar a que todos os documentos carregados na plataforma eletrónica deverão ser assinados eletronicamente mediante a utilização de certificados de assinatura eletrónica qualificada.
Há ainda uma acrescida questão que resulta da circunstância de se não vislumbrar que a assinatura aposta nos ficheiros relacione o assinante com a sua função e poder de assinatura, pois que não se vislumbra que tenha sido junto qualquer documento fazendo prova do poder de representação e assinatura do subscritor.
Pela informação prestada pela Saphety Level, enquanto gestora da plataforma eletrónica, apenas se conclui singelamente que os elementos apresentados pela Autora “foram assinados mediante a aposição de assinatura qualificada do cartão de cidadão de DODS, diretamente na plataforma...”, o que não atesta a sua qualidade ou suscetibilidade de representação do concorrente.
Não obstante o referido, a então Autora invoca a invalidade do ato da Entidade Demandada que determinou a exclusão da sua proposta do procedimento, em resultado da violação dos arts. 54.º e 68.º da Lei n.º 96/2015, de 17 de agosto, do art. 62.º do Código dos Contratos Públicos e do art. 7.º do Código de Procedimento Administrativo.
Entende que procedeu à assinatura qualificada de todos os documentos e ficheiros que integram a proposta, utilizando como forma de certificação o cartão de cidadão do seu representante.
Em qualquer caso, como vimos, os documentos devem ser assinados individualmente, independentemente da assinatura aposta nos ficheiros pela plataforma eletrónica, através de assinatura eletrónica qualificada.
Entendeu, no entanto, o tribunal a quo, que sendo o ficheiro o elemento eletrónico e o documento o respetivo conteúdo, quando cada ficheiro diga respeito a um único documento exigido pelo procedimento (cfr. art. 66.º, n.º 1, al. a), da Lei n.º 96/2015), não haveria necessidade de duplicar assinaturas, entendimento que como se viu, se não acompanha.
Efetivamente, para que não possam subsistir quaisquer dúvidas, reitera-se que o n.º 3 da Cláusula 8ª do Programa do Concurso é explícito ao prever que “Todos os documentos carregados na plataforma eletrónica deverão ser assinados eletronicamente mediante a utilização de certificados de assinatura eletrónica qualificada.”
Acresce que o art.º 62.º do CCP prevê que: 1 - Os documentos que constituem a proposta são apresentados diretamente em plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante, através de meio de transmissão escrita e eletrónica de dados ... 4 - Os termos a que deve obedecer a apresentação e a receção das propostas nos termos do disposto nos n.ºs 1 a 3 são definidos por diploma próprio.
Correspondentemente, refere-se no art.º 54.º da Lei n.º 96/2015, de 17 de Agosto que “1- Os documentos submetidos na plataforma eletrónica, pelas entidades adjudicantes e pelos operadores económicos, devem ser assinados com recurso a assinatura eletrónica qualificada, nos termos dos n.ºs 2 a 6.(...)
7 - Nos casos em que o certificado digital não possa relacionar o assinante com a sua função e poder de assinatura, deve a entidade interessada submeter à plataforma eletrónica um documento eletrónico oficial indicando o poder de representação e a assinatura do assinante.”
Não resulta dos autos qualquer demonstração do cumprimento pontual por parte da então Autora do citado n.º 3 da Cláusula 8ª do Programa de Concurso, o art.º 62.º, nºs 1 e 4 e o art.º 54.º, nºs 1 e 7 da Lei n.º 96/2015 de 17 de Agosto, designadamente no que respeita à aposição de assinatura digital eletrónica qualificada nos documentos da proposta apresentada.
Em qualquer caso, se a questão controvertida se cingisse à falta de prova da representatividade de quem assinou a proposta, admite-se que o concorrente pudesse, em tempo, ter sido convidado a suprir tal irregularidade. Em qualquer caso, a questão aqui é diversa, pois que são as próprias propostas que se não encontram sequer individualmente assinadas.
A Jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores tem sido abundante e, no essencial, concordante.
Veja-se o sumariado no Acórdão deste TCAN nº 02389/10.4BELSB, de 25.11.2011, onde se afirmou que “(...) Tais documentos carregados nas plataformas eletrónicas deverão ser assinados eletronicamente mediante a utilização de certificados de assinatura eletrónica qualificada, sendo que no caso em que o certificado digital não possa relacionar diretamente o assinante com a sua função e poder de assinatura a entidade interessada deverá submeter à plataforma um documento eletrónico oficial indicando o poder de representação e assinatura do subscritor.”
Igualmente se sumariou no Acórdão do STA nº 01056/11 de 08-03-2012, que “(...) A apresentação da proposta [e documentos anexos] no âmbito de procedimento concursal desenvolvido sob a égide de Plataforma eletrónica tem de ser produzida por meio de transmissão eletrónica e a sua assinatura deve ser feita eletronicamente, sendo que no caso do certificado digital não relacionar diretamente o assinante com a sua função e poder de assinatura é obrigatório que o candidato/concorrente submeta à Plataforma um documento eletrónico oficial indicando o poder de representação e assinatura do assinante.”
Em face de tudo quanto precedentemente se expendeu, não se acompanha a decisão proferida pelo tribunal a quo, não merecendo, ao invés, censura a decisão objeto de impugnação proferida pela Entidade Administrativa.
Finalmente, e no que concerne à fundamentação do ato da Administração, refira-se que resulta, nomeadamente, do relatório final que deu origem à decisão de adjudicação, uma suficiente e adequada explicitação dos elementos que a justificam, o que determinará, que também por essa razão se concederá provimento ao Recurso, mais se julgando improcedente o presente Processo Pré-contratual.
* * *
Deste modo, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao Recurso, revogando-se a Sentença Recorrida, mais se julgando improcedente o presente Processo Pré-contratual.
Fixa-se em 30.000,01€ o Valor da Ação
Sem Custas, nesta instância, perante a ausência de apresentação de contra-alegações de recurso
Porto, 12 de julho de 2018
Ass. Frederico de Frias Macedo Branco
Ass. João Beato
Ass. Hélder Vieira